A intenção é aperfeiçoar as normas que regulamentam o acesso aos recursos genéticos para fins de pesquisa científica e de desenvolvimento tecnológico
Em vigor há mais de uma década, a Medida Provisória que regulamenta a pesquisa relacionada ao acesso ao patrimônio genético brasileiro e aos conhecimentos tradicionais associados será aperfeiçoada. A proposta, coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), está sendo conduzida por um grupo de trabalho formado também pelos ministérios de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), segundo informou ao Jornal da Ciência a diretora do Departamento do Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente e secretária-executiva do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), Eliana Maria Fontes.
A intenção é aperfeiçoar as normas que regulamentam o acesso aos recursos genéticos para fins de pesquisa científica e de desenvolvimento tecnológico, para , por exemplo, serem empregados no desenvolvimento de um novo remédio, de cosméticos ou mesmo no melhoramento genético para aprimoraras variedades agrícolas. O estímulo à pesquisa e ao desenvolvimento de tecnologias podem ampliar o uso comercial, nacional e internacional, de produtos da biodiversidade brasileira.
Na prática, o que está sendo costurado com os diferentes ministérios, segundo Eliana, é um novo texto legal para substituir a legislação vigente, a MP 2186-16/2001, com a participação da indústria de fármacos e de cosméticos, além do agronegócio e de outros setores da sociedade civil, como a comunidade científica.
Racionalização - O objetivo da proposta é também simplificar o acesso ao patrimônio genético, trazendo regras mais claras para a repartição de benefícios provenientes da utilização de componentes da biodiversidade, segurança jurídica e redução da burocracia. Entre as principais medidas previstas está o fim da exigência da autorização prévia à pesquisa pelo CGEN. Ou seja, pesquisadores, instituições e empresas não precisarão mais pedir autorização ao órgão para iniciar uma pesquisa com biodiversidade brasileira. Tal acesso será feito por um cadastro online e, pelo que consta no novo texto, esses chamados "usuários" terão que informar o CGEN que foi desenvolvido um produto e que este está pronto para ser colocado no mercado. O CGEN irá então emitir atestado de que o usuário está cumprindo a legislação nacional e, o usuário deverá então, a partir da notificação, que apresentar o Contrato de Repartição de Benefícios no prazo de um ano.
Conforme avalia Eliana, pelas regras atuais, a autorização prévia do CGEN à pesquisa representa um empecilho em decorrência da lentidão em sua liberação. Atualmente a tramitação demora aproximadamente dois meses em média. Pelo processo online, segundo Eliana estima, esse prazo pode ser encurtado para 20 dias. "Hoje é ainda difícil (a autorização) porque o usuário não entende muito da legislação que, por sua vez, tem um arcabouço incompleto, o que demanda tempo do CGEN", disse.
Repartição de benefícios - Haverá mudança também na apresentação do acordo de repartição de benefícios - o qual será apresentado ao CGEN também quando o produto estiver sendo comercializado no mercado, após um ano de lançamento. Hoje as indústrias de fármacos, de cosméticos e do agronegócio têm a obrigação de compartilhar o lucro das vendas dos produtos, advindos da utilização de componentes da biodiversidade ou da utilização do conhecimento tradicional associado, com comunidades locais, Povos Indígenas, seringueiros, pequenos agricultores, pescadores, governo ou proprietários de áreas privadas de onde é extraído o patrimônio genético.
A repartição dos benefícios pode ser monetária, seja pela distribuição do lucro das vendas anuais dos produtos advindos da utilização de componentes da biodiversidade, seja pela distribuição de royalties. Algumas empresas propõem repartição de 0,5% do lucro, enquanto outras concedem dividendos superiores a 1%. A contribuição financeira pode ser destinada à melhoria do extrativismo, à conservação da biodiversidade e em capacitação técnica. Há também a previsão de acesso facilitado ou transferência de tecnologia quando envolver acordo entre universidade e empresa.
Histórico - Desde a implementação da MP, o CGEN elabora normas para facilitar a aplicação dessa legislação. Mesmo assim, Eliana reconhece que os usuários da MP ainda se deparam, no dia-a-dia, com a necessidade de tornar os procedimentos mais fáceis e mais claros.
Recentemente, o CGEN aprovou a nova resolução, de nº 40, na tentativa de resolver, por exemplo, o impasse no âmbito da repartição de benefícios quando não é possível identificar o provedor do patrimônio genético. Essa norma ainda precisa passar pelo crivo do Conselho Jurídico (Conjur) do Ministério do Meio Ambiente e, posteriormente, pelo da ministra Izabella Teixeira. Depois, o ato será publicado no Diário Oficial.
Eliana afirma que atualmente pesquisadores ou empresas pegam as amostras do patrimônio genético fora do ambiente em que a espécie foi desenvolvida naturalmente, ou seja, na prateleira de um supermercado, dificultando a identificação do provedor desse recurso genético. "E não se pode compartilhar os benefícios com os supermercados, já que quem plantou o maracujá, por exemplo, foi um agricultor e muitas vezes o supermercado não tem como rastrear a origem do produto", exemplifica.
Embora o Brasil seja pioneiro na aplicação de legislação para o acesso ao patrimônio genético, Eliana reconhece que a experiência brasileira não tem sido bem-sucedida."Nossa lei ainda tem limitações que não conferem praticidade, não estimula o uso de recursos genético nem a pesquisa. Pelo contrário, espanta os interessados em pesquisar a biodiversidade brasileira".
Inovação - O aperfeiçoamento da MP, avalia Eliana, abre espaço para o desenvolvimento científico e tecnológico nacional, podendo resultar em inovações tecnológicas, em dividendos e dinamismo econômico. Para ela, haverá também o retorno financeiro para as comunidades mantenedoras das florestas e que cuidam da biodiversidade, para que a mata não seja derrubada e transformada em pasto ou em um campo de soja.
Eliana frisa que a biodiversidade brasileira - a maior do mundo - tratada adequadamente, será essencial na geração de divisas econômicas. Dados do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos revelam que a indústria mundial de fármacos, por exemplo, faturou cerca de US$ 880 bilhões em 2011. Do total de medicamentos fabricados no mundo para o controle de câncer, 77% são oriundos de moléculas naturais, extraídas da natureza.
Segundo Eliana, esses números dão a ideia do potencial e do faturamento das empresas que exploram as moléculas da natureza, nativas da biodiversidade. "É disso que precisamos correr atrás. Queremos promover um ambiente que favoreça inovação nessa área com a garantia do compartilhamento dos benefícios", planeja.
(Viviane Monteiro / Jornal da Ciência
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quarta-feira, 10 de abril de 2013
Governo prepara Projeto de Lei para simplificar acesso ao patrimônio genético da biodiversidade brasileira
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