Uma das soluções seria ingerir o alimento cozido à temperatura superior a 90 ºC
Um grupo de pesquisadores brasileiros avaliou os impactos de diferentes graus de poluição na criação da ostra-do-pacífico em Florianópolis, capital de Santa Catarina, responsável por 95% da produção do molusco no Brasil. Em busca de um diagnóstico sobre as condições dos animais comercializados, o estudo publicado em fevereiro naEcotoxicology and Environmental Safetyconfirmou que as ostras podem acumular em seu organismo compostos químicos e agentes como vírus, bactérias e protozoários,causadores de doença em pessoas. Esses organismos podem provocar infecções, principalmente em quem ingere o alimento cru. A pesquisa também mostrou que moluscos provenientes de locais de criação de ostras continham vírus mesmo quando os locais de cultivo apresentavam níveis aceitáveis de coliformes fecais, segundo resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Situações críticas foram encontradas em animais experimentalmente colocados em ambientes mais poluídos, não usados como criadouros.
A ostra (Crassostrea gigas) se alimenta dos plânctons que vivem à deriva no mar, e faz isso sugando e filtrando a água. “Além do próprio alimento, ela absorve outros compostos químicos e orgânicos que estão na água que ser morta ou se infectar com esses vírus, bactérias e protozoários. Eles ficam retidos no tecido do animal, protegidos de agressões como a radiação ultravioleta do Sol”, conta a coordenadora do estudo Célia Regina Monte Barardi, do Laboratório de Virologia Aplicada do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). As ostras podem acumular metais, pesticidas e outros compostos orgânicos em seus tecidos e nas brânquias, chegando a concentrações maiores do que as presentes na água do mar. Portanto, a qualidade dos moluscos comercializados está relacionada às condições sanitárias das águas onde são cultivadas.
O estudo foi realizado em parceria com o Núcleo de Estudos em Patologia Aquícola e Centro de Ciências Agrárias e Laboratório de Biomarcadores de Contaminação Aquática (ambos da UFSC), Laboratório de Química Orgânica Marinha da Universidade de São Paulo (USP) e Laboratório de Protozoologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Os pesquisadores inseriram ostras provenientes do Laboratório de Cultivo de Moluscos Marinhos (UFSC), situado em Sambaqui (veja mapa) em quatro locais: Ribeirão da Ilha (número 1 no mapa) e Santo Antônio de Lisboa (2), onde atualmente há cultivo de moluscos; Tapera (3), com cultivo desativado devido à proximidade da costa e tráfico intenso de barcos, o que causam a contaminação do mar; e foz do rio Bücheler (4), impróprio para cultivo por receber despejo de esgoto.
A água do mar e os sedimentos foram analisados no momento em que os pesquisadores deixaram as ostras e 14 dias depois, quando as recolheram. A equipe verificou por meio de análise microbiológica a contaminação dos moluscos por vírus que atacam humanos, compostos orgânicos, protozoários e bactérias como coliformes fecais, eliminados pelas fezes e urina das pessoas, além de metais pesados, derivados de petróleo e pesticidas despejados no mar.
Como esperado, as ostras coletadas da foz do rio Bücheler, o mais poluído dos quatro locais estudados, continham um maior número de patógenos humanos: adenovírus (que pode causar infecção nas vias respiratórias, conjuntivite ou gastroenterite), norovírus (principal causa não bacteriana de gastroenterite aguda), vírus da hepatite A, poliomavírus (perigoso para pessoas com baixa imunidade) e coliformes fecais. Pesticidas, hidrocarbonetos e esteroides também foram encontrados dentro das ostras retiradas próximas ao rio Bücheler. Já as coletadas na antiga área de cultivo Tapera continham norovírus, coliformes fecais e o protozoário Cryptosporidium spp., que pode desencadear problemas intestinais.
As ostras coletadas nas duas áreas usadas atualmente para cultivo, Ribeirão da Ilha e Santo Antônio de Lisboa, apresentaram menor quantidade de desencadeadores de doenças comparados às outras regiões analisadas. Porém, como eles filtram a água do mar, os moluscos provenientes dessas regiões ainda correm risco eventual de contaminação. Isso porque ambos os locais estão sujeitos a receber a entrada de esgoto doméstico, rural, urbano tratado e não tratado e poluentes, como derivados do petróleo.
“Uma solução para quem gosta dos moluscos seria ingerir o alimento cozido, pode ser ‘no bafo’ (vapor), a uma temperatura superior a 90 ºC. Essa ação inativa vírus, protozoários e coliformes fecais”, explica a pesquisadora. Porém, não elimina pesticidas ou metais pesados.
“Outra maneira de proteger a população da contaminação por microrganismos, pesticidas ou metais pesados seria cultivar a ostra em água limpa”, conta Célia. Com o objetivo de reduzir o risco de contaminação por microrganismos causadores de doença, os pesquisadores da UFSC, entre eles uma das autoras do estudo Doris Sobral Marques Souza, estão testando pequenos depuradores em forma de tanques. “A água desses depuradores é esterilizada com luz ultravioleta. Como a ostra se alimenta ao filtrar a água, esperamos que a permanência dos moluscos dentro dos tanques com água do mar purificada pela radiação ultravioleta, diminua a quantidade dos contaminantes retidos pelas ostras”, diz a pesquisadora. A ideia é instalar equipamentos dentro de restaurantes e estabelecimentos que comercializam o molusco.
http://revistapesquisa.fapesp.br/2012/03/28/ostras-podem-acumular-agentes-causadores-de-doen%C3%A7as-comprova-pesquisa/
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