quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Abate não fiscalizado de bovinos é estimado pelo Cepea/USP em menos de 10%

O número de bovinos abatidos sem nenhum registro de fiscalização sanitária – municipal, estadual ou federal – é menor do que muitos poderiam estimar. Levantamentos do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, indicam que menos de 10% dos abates estiveram nesta condição em 2012.
Segundo os autores da pesquisa, os resultados obtidos, bem menores que os encontrados na literatura referentes a décadas passadas, evidenciam as mudanças positivas que a pecuária nacional, como um todo, vem implementando. Segundo os pesquisadores, podem ser citados o fortalecimento do aparato legal sanitário, com foco em qualidade de processo, o salto tecnológico e gerencial das indústrias e a internacionalização do setor de carne brasileiro.
Além de analisar o abate que não teve acompanhamento do serviço de inspeção federal, nem do estadual nem do municipal pela via da oferta (de animais para abate), os pesquisadores o estimaram, de forma inédita, também pela perspectiva da demanda (por carne). A aplicação dessas duas metodologias funciona como uma contrachecagem dos resultados que, ao final da pesquisa, mostraram-se bastante semelhantes.
Do lado da oferta, o volume não fiscalizado correspondeu de 7,4% a 8,9% do total abatido em 2012 nos estados da pesquisa. O resultado na forma de intervalo decorre de problemas no ajustamento dos valores oficiais de abate, já que alguns estados forneceram dados incompletos. Pela abordagem da demanda – é menor o grau de detalhamento dos dados –, o abate não fiscalizado foi estimado em 7,6% do total de animais abatidos para atender à demanda por carne no país.
Em linhas gerais, para chegar aos resultados, a equipe do Cepea estimou a oferta de animais para abate e também a quantidade de animais necessária para atender a demanda nacional por carne bovina, tudo referente ao ano 2012. Esses volumes foram, então, comparados ao abate oficial (com fiscalização sanitária). A diferença é o “não fiscalizado”, expressão adotada pelos autores em detrimento de “abate clandestino”, que pode render interpretações não cobertas por esta pesquisa – como a fiscalização tributária/fiscal dos abates.
Pelo lado da oferta, o estudo abrangeu os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Pará, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e também o Distrito Federal. Para alguns estados, porém, as estimativas são parciais e devem ser aprimoradas conforme se obtenham dados mais detalhados. Para outros, não foram obtidas informações consistentes. Por essas dificuldades, os autores da pesquisa ressaltam que os resultados da estimativa do abate não fiscalizado pela via da oferta de animaisdizem respeito a 84% do rebanho e a 85% do total abatido em 2012, segundo estimativas do IBGE.
Oferta sem fiscalização sanitária – Para mensurar a oferta de animais para abatem 2012 que não foi contabilizada pelos órgãos de inspeção sanitária, os pesquisadores utilizaram a estrutura de propriedades típicas em dezenas de regiões do País já constante dos bancos de dados do Cepea – trabalho realizado desde 2002 em parceria com a CNA – e informações secundárias. Neste grupo, incluem-se: o total de animais vacinados na segunda campanha (novembro) contra a febre aftosa de 2012, Guias de Trânsito Animal (GTA) – documento federal obrigatório tanto para o trânsito intra quanto interestadual de animais, independentemente da finalidade – e também o número de animais abatidos pelos Sistemas de Inspeção Federal (SIF), Estadual (SIE) e Municipal (SIM). Parte dos estados, no entanto, não forneceu dados detalhados sobre o abate de animais sob inspeção estadual e municipal nem as GTAs, o que limitou a precisão dos resultados.
Animais abatidos para autoconsumo, ou seja, destinados ao consumo daqueles diretamente relacionados à propriedade pecuária não foram incluídos como “não fiscalizado”, já que não têm finalidade comercial. Segundo os pesquisadores, encontram-se na literatura trabalhos que estimam o autoconsumo de produção agropecuária em geral na zona rural – especialmente em unidades de agricultura familiar –, mas nada que quantifique o autoconsumo de carne bovina. Haveria uma lacuna na literatura técnica ou acadêmica, o que torna este estudo um marco também sobre esse tópico no Brasil.
A estimativa do autoconsumo de carne bovina feita pela equipe do Cepea envolve informações da PNAD e da POF, ambas do IBGE, do Ministério do Trabalho, de painéis realizados pela própria equipe em parceria com a CNA e de outros levantamentos de campo específicos sobre consumo de carne bovina per capita por estado, percentual de funcionários que vivem na propriedade e percentual de propriedades que abatem bovinos. O resultado geral, referente ao País todo, sinaliza que o autoconsumo na zona rural absorveu, em 2012, cerca de 4 milhões de cabeças. A equipe responsável pela pesquisa, no entanto, destaca que também os cálculos de autoconsumo podem ser refinados com o amadurecimento da metodologia ora aplicada.
Sob esses parâmetros metodológicos, o número de animais abatidos não inserido em qualquer sistema de fiscalização é o resultado do número de animais ofertados em 2012, subtraído o autoconsumo no mesmo ano. Assim, o percentual de abate não fiscalizado foi obtido pela comparação desse valor final com os dados oficiais de animais abatidos com fiscalização.
Os resultados variaram consideravelmente entre os estados. No Espírito Santo e em Mato Grosso do Sul, estão os menores índices de abate não fiscalizado, calculados em apenas 4,1% e 4,8%.No outro extremo, está Minas Gerais, com 15,2% – veja a relação completa na tabela abaixo; abordagem da oferta.
A região Norte, representada pelos estados do Pará e Tocantins – cerca de 60% do rebanho da macrorregião – apresentou o maior percentual de abate não fiscalizado, 11,2%. Em situação oposta está o Sul, com média de 5,2%. Do Nordeste, apesar da contribuição de alguns estados, foi possível considerar somente dados da Bahia – 36% do rebanho nordestino – e, nesta unidade da federação, a informalidade foi estimada em 10,4%. No Sudeste, a pesquisa do Cepea aponta que 9,5% dos abates ainda ocorrem ao largo de qualquer fiscalização sanitária.
Esse resultado médio foi influenciado por Minas Gerais (15,2%), que tem agropecuária bastante heterogênea, já que Espírito Santo aparece com apenas 4,1% de abates não fiscalizados; Rio de Janeiro e São Paulo, com cerca de 5%. No Centro-Oeste, onde é forte a presença de frigoríficos com inspeção federal e é maior a distância dos centros consumidores, o que estimula o autoconsumo nas propriedades, a média é de 5,7%.
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Demanda sem fiscalização sanitária – Na outra frente da pesquisa, quando o objetivo era estimar o número de animais para atender ao consumo de carne bovina brasileira e compará-lo com o total de abates fiscalizados, os pesquisadores trabalharam com dados de todo o País. Foram considerados o consumo de carne bovina por estado, o volume produzido também pela mesma unidade da federação (ponderando-se o rendimento de carcaça e o peso médio do animal), o volume importado, o exportado e, nesta via de análise, também o autoconsumo.
Todos os dados foram convertidos em número de cabeças equivalentes e calculado o necessário para suprir o volume consumido. A equação desenvolvida pela equipe do Cepea levou em conta ainda a elasticidade renda-consumo por região, a taxa de crescimento do rendimento familiar por estado e a taxa de crescimento da própria população.
Os resultados desta estimativa (rebanho necessário para atender à demanda por carne) foram comparados ao número de animais abatidos sob fiscalização de uma das três esferas. A diferença, 7,6%, é, então, assumida como a proporção de animais abatidos sem fiscalização no Brasil, utilizando-se a abordagem da demanda.
Em termos absolutos, os pesquisadores do Cepea calcularam que o consumo interno de carne bovina no Brasil em 2012 foi ao redor de 6,9 milhões de toneladas, face à produção total de 8,5 milhões de toneladas, que corresponderia à demanda de abate de 37,9 milhões de cabeças naquele ano.
Todas as estimativas de demanda por carne e animais foram feitas também por unidade da federação, mas, pela falta de informações sobre o comércio interestadual de carne no Brasil, não foi possível determinar quanto da demanda (equivalente em animais) de cada estado seria atendida por carne sem fiscalização sanitária.
Continuidade – Conforme os autores da pesquisa, os percentuais de abate não fiscalizado ora apresentados podem ser refinados à medida que órgãos governamentais aprimorem a coleta, tabulação e fornecimento de dados. A pecuária bovina de corte é relevante em termos de segurança alimentar, de renda gerada no campo e contribui para o equilíbrio das contas do país, o que justifica suficientemente o empenho para que se tenham dados consistentes sobre o setor. Por outro lado, reconhece-se que implementar e administrar com eficiência sistemas de controle em um país de dimensões continentais como o Brasil é um grande desafio.
Mais que as estimativas obtidas para o ano de 2012, os pesquisadores destacam que este trabalho resultou na construção de metodologias consistentes para a análise tanto do abate não fiscalizado quanto do autoconsumo de carne bovina.
Autores da pesquisa – Este trabalho é de autoria do Cepea, da Esalq/USP. Foi elaborado com a coordenação dos professores Sílvia Helena G. de Miranda e Sergio De Zen, que contaram com a equipe de pesquisadores formada por: Mariane C. dos Santos, Daniel M. Velazco Bedoya, Graziela N. Correr, Wagner H. Yanaguizawa e Gabriela G. Ribeiro.
Financiadores – Esta pesquisa teve o apoio financeiro das seguintes instituições: Grupo Pão de Açúcar, Carrefour, Walmart, JBS, Minerva Foods, Marfrig,  Rodopa e Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Fonte: CEPEA, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/abate-nao-fiscalizado-de-bovinos-e-estimado-pelo-cepeausp-em-menos-de-10/

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