“Eu não planejo ser Deus, nunca planejei e fiquei muito chateado como as pessoas repercutiram negativamente sobre o caso”. A declaração do cientista Eckard Wimmer, em tom de desabafo, foi feita em entrevista após a conferência proferida na quinta-feira (21/10), no Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Wimmer, que trabalha no Departamento de Genética e Microbiologia da Universidade Stony Brook, nos Estados Unidos, publicou na revistaScience, em 2002, o artigo que relata a criação do vírus sintético da poliomielite – considerada um marco na biotecnologia, por ser o primeiro vírus construído em laboratório.
Wimmer destacou a possibilidade de desenvolvimento de vacinas com base na biologia sintética (Foto: Rodrigo Ávila/IOC) |
A convite do pesquisador Edson Elias da Silva, chefe do Laboratório de Enterovírus do IOC, Wimmer apresentou a conferência Recodificação de genomas virais de RNA através da síntese do genoma inteiro: genética e aplicações práticas para um público formado por cientistas, estudantes e jornalistas. Durante uma hora de apresentação, o pesquisador – que visita o Brasil pela primeira vez –, falou sobre a recodificação do genoma do RNA do vírus da pólio apontando o procedimento da pesquisa que revolucionou a biologia.
Perdas e ganhos
“A nova era da genética esta aí. A descoberta do sequenciamento do genoma humano foi algo extraordinário. O que vem ocorrendo agora é um grande volume de sequenciamentos do genoma de milhares de vírus”, destacou. “O desenvolvimento de vacinas a partir da recodificação do genoma de um vírus é algo inovador. Todos estes trabalhos na criação de microorganismos sintético significam uma revolução em novas vacinas, novos medicamentos e na produção de biocombustíveis”.
Ao mesmo tempo em que abre caminho para novas formas de combate a doenças, a biologia sintética é observada com cautela por Wimmer. “Nós não podemos proteger totalmente os dados daqueles que poderiam fazer mau uso dos avanços da biologia sintética. A responsabilidade cabe aos cientistas, de agir eticamente”, afirma. “Existe sim motivo para temer que grupos mal intencionados, com recursos, possam acessar na internet o genoma de um vírus como o da varíola e criá-lo em uma estrutura de laboratório”, frisou.
Perfil
Eckard Wimmer nasceu em Berlim em 1936, em pleno regime nazista, três anos antes da eclosão da II Guerra Mundial. Em 1962, Wimmer recebeu o título de doutor rerum naturarum(Dr. rer. nat.), denominação específica para título em PhD em ciências naturais na Alemanha. O cientista tem pós-doutorado em química orgânica pela Universidade de Göttingen. Seis anos depois, emigrou da Europa em direção aos Estados Unidos. Atualmente, vive em Long Island, Nova Iorque, próximo ao campus da universidade onde atua. Desde 1974 é membro do Departamento de Genética Molecular e Microbiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Stony Brook, onde foi reitor entre 1984 e 1999.
O pesquisador já publicou cerca de 300 artigos científicos. Em 1991, publicou a síntese do vírus da poliomielite – experiência que estimulou vários estudos sobre replicação viral. A partir da síntese, em 2002 o cientista publicou os estudos sobre a síntese do vírus da polio na ausência de um modelo natural fora das células vivas. O trabalho, que marcou uma nova era na Biologia com a criação do primeiro vírus artificial em laboratório, chamou a atenção mundial, com elogios e críticas pesadas da comunidade científica e da sociedade civil.
O feito foi reconhecido como uma nova estratégia de investigação da função gênica e da patogenicidade, permitindo alterações em larga escala em um genoma. Wimmer e seus colaboradores recodificaram e desenvolveram genomas virais de RNA alterados por computadores, através da síntese do genoma. A estratégia, segundo Wimmer, é levar a engenharia de genomas virais para o desenvolvimento de vacinas.
Publicado em 22/10/2010.
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