terça-feira, 16 de abril de 2013

Bactérias resistentes abrem a possibilidade de uma era pós-antibióticos


"O mundo está prestes a perder essas curas milagrosas", já disse a diretora da OMS (Organização Mundial da Saúde), Margaret Chan, sobre os antibióticos.
Chan se referiu a um futuro tenebroso --e possível-- no qual infecções comuns não terão cura. É o que especialistas chamam de era pós-antibióticos.
Esses remédios têm como alvo as bactérias, mas esses micro-organismos sempre acham uma forma de sobreviver e se tornarem resistentes, o que pede o uso de novos medicamentos. Por isso, antibióticos têm um tempo determinado de validade.
O problema é que o arsenal terapêutico e o desenvolvimento de novas drogas só diminuiu nas últimas décadas. A última classe de antibióticos foi descoberta em 1987.
O mal uso dos antibióticos (seja sem necessidade ou por tempo e dose incorretos) e o maior tráfego global de bactérias resistentes pioram o cenário.
Neste ano, um relatório dos Centros de Controle de Doenças dos EUA chamou a atenção para o problema da gonorreia resistente às cefalosporinas, classe de antibióticos usados no tratamento dessa doença sexualmente transmissível.
Para retardar o surgimento de uma superbactéria resistente, os CDCs mudaram as diretrizes do tratamento, que agora deve combinar um remédio oral e outro injetável.
As bactérias causadoras da tuberculose também geram preocupação, assim como a KPC, resistente à maioria dos medicamentos e que normalmente atinge pessoas hospitalizadas.
Na semana passada, o Hospital de Clínicas da Unicamp anunciou que teve 11 casos de infecções pela KPC entre dezembro e março.

FALTA DE INVESTIMENTO
O corte em investimentos em pesquisa e desenvolvimento de antibióticos pelos laboratórios multinacionais se deve, em parte, a fusões recentes entre as grandes empresas do setor.
Segundo a OMS, 8 das 15 maiores farmacêuticas que tinham programas de descoberta de antibióticos abandonaram essa área --outras duas reduziram seus esforços.
Anna Sara Levin, coordenadora do grupo de controle de infecção hospitalar do Hospital das Clínicas da USP, lembra que drogas antigas para hipertensão e diabetes, desenvolvidas nos anos 1950, ainda funcionam, ainda que existam opções mais modernas.
"Já com os antibióticos, a resistência vai aparecer de qualquer maneira. Como as pesquisas são caras e levam tempo, a indústria vê isso como um mau negócio."
É nesse "vácuo" que médicos, pesquisadores e autoridades de saúde da Suécia veem "uma oportunidade e a responsabilidade" de oferecer soluções, segundo Linus Sandegren, pesquisador do departamento de bioquímica médica e microbiologia da Universidade de Uppsala, no norte da Suécia.
O país tem uma taxa baixa de resistência a antibióticos, mas cinco universidades na região de Estocolmo e Uppsala desenvolvem mais de 30 projetos de estudo nessa área.
"O país percebe que a resistência é um problema enorme e que é preciso investir dinheiro agora para evitar uma catástrofe depois", afirma Anna Zorzet, diretora-executiva-assistente do ReAct, uma rede global independente contra a resistência a antibióticos, sediada na Universidade de Uppsala.

Em 2012, o primeiro-ministro sueco anunciou um investimento de US$ 220 milhões para os quatro anos seguintes em pesquisas nessa área.
As investigações incluem o desenvolvimento de novas drogas e a revisão de medicamentos antigos ou que foram descartados anteriormente.
Um dos estudos clínicos, no Hospital Universitário de Uppsala, pretende determinar regimes de dosagem ideais de antibióticos e testar combinações de drogas existentes contra bactérias multirresistentes.
NOVA GERAÇÃO
Mas só o lançamento de novos antibióticos no mercado não vai resolver o problema da resistência a antibióticos, segundo Diarmaid Hughes, professor de bacteriologia molecular médica da Universidade de Uppsala.
"É necessário antes aprender sobre o uso e o abuso de antibióticos das últimas décadas que fizeram o problema da resistência chegar nesse estado atual; chegar à raiz do problema antes do possível mau uso de uma nova geração de antibióticos."
Anna Sara Levin, do HC, toca no mesmo ponto. "Para não vivermos uma situação catastrófica no futuro, a solução é a prevenção. Isso inclui o uso racional dos antibióticos e o controle das infecções hospitalares."
Segundo ela, a maior parte do problema no Brasil não está na geração desses micro-organismos resistentes mas sim na sua transmissão.
"Cada 'monstro' gerado é disseminado para outros pacientes e outros hospitais. Por isso, é primordial melhorar a qualidade dos serviços de saúde."
Editoria de arte/Folhapress

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